ENTRE NARRATIVAS CONVENIENTES E A REALIDADE DO MERCADO

O mercado futuro de açúcar em Nova York encerrou a sexta-feira com o contrato março/25, que expira na próxima semana, cotado a 21.31 centavos de dólar por libra-peso, registrando uma alta de 91 pontos, o que equivale a pouco mais de 20 dólares por tonelada. Com a proximidade do vencimento, o foco do mercado se desloca para o contrato maio/25, que começará a refletir as expectativas de volume de cana no início da safra 2025/26.

O contrato maio/25 fechou a semana a 19.91 centavos de dólar por libra-peso, uma valorização de 76 pontos em relação ao fechamento da semana anterior, correspondente a 16.75 dólares por tonelada. De forma geral, os preços apresentaram maior valorização nos vencimentos mais curtos. A média dos contratos da safra 2025/26 (de maio/25 a março/26) subiu 50 reais por tonelada na semana, enquanto a safra 2026/27 – que começa a refletir um avanço no percentual de fixação – registrou uma valorização de 32 reais por tonelada.

Ainda é cedo para cravar qualquer coisa, mas os usineiros de São Paulo já estão de sobrancelha franzida com a qualidade da cana para a safra que se inicia. As estimativas de produção variam entre 590 e 630 milhões de toneladas, o que só reforça que ninguém está muito seguro sobre o volume a ser moído. E com razão: há relatos de canaviais que não estão com o vigor esperado para esta época do ano, o que pode levar a um atraso no início da safra. Muito cedo para afirmar, mas plausível o suficiente para tirar o sono de alguns.

Enquanto isso, na Índia, a bola de cristal está tinindo. Com a eficiência de um oráculo, já projetam uma safra de 38 milhões de toneladas de açúcar para 2025/26, que só começa daqui a sete meses! Com todo o respeito aos nossos amigos indianos, se há um candidato a protagonista da volatilidade este ano, a Índia veste bem essa camisa.

Por ora, a atenção segue voltada para o início da safra no Brasil. Usinas que planejavam começar a moer em 1º de abril já empurraram a data para o dia 14, e outras já falam em 21. O mercado não deixou passar batido: o spread maio/julho já reflete essa incerteza. No final de janeiro, maio negociava com um prêmio de 7.50 dólares por tonelada sobre julho. Três semanas depois, fechamos a semana com o prêmio em 10 dólares por tonelada. O mercado já começou a precificar a dúvida.

Mesmo que tudo corra perfeitamente no início da moagem no Centro-Sul, a história nos ensina uma lição: nunca – pelo menos não neste século – os preços médios mais altos do açúcar negociado em Nova York ocorreram no quadrimestre abril-maio-junho-julho. E não é por acaso. Esse período coincide com o pico da moagem de cana, o que naturalmente significa maior oferta de açúcar e, consequentemente, pressão sobre os preços.

Mas, a volatilidade pode vir de longe – mais precisamente da Índia. Explico: se confiarmos nos números indianos de estoque inicial e considerarmos que a produção deste ano, já descontado o volume desviado para etanol, fique entre 26.0 e 26.5 milhões de toneladas, há um dado que chama atenção. O consumo doméstico da Índia, que me surpreende ser "apenas" 29 milhões de toneladas, projeta um estoque de passagem no final da safra suficiente para meras cinco semanas de consumo. E por que isso importa? Porque cinco semanas de estoque para um país do tamanho da Índia é como atravessar um deserto com um cantil furado – pode até dar certo, mas as chances de desidratação no meio do caminho são grandes. Se a matemática indiana estiver errada, o mercado de açúcar pode virar uma montanha-russa daquelas que só sobe quando você está sem hedge.

No último quadrimestre do ano, uma possível decepção com a safra do Centro-Sul combinada com uma produção indiana abaixo das expectativas para 2025/26 pode ter um efeito explosivo. Sim, são muitos “ses” – quase um exercício de futurologia – mas o fato é que o mercado parece determinado a acreditar que os preços vão se manter entre 16 e 19 centavos de dólar por libra-peso, mesmo sem fundamentos sólidos que sustentem essa narrativa.

Se há algo que aprendemos em 2023, é que o mercado adora uma boa história – especialmente quando os fundos especulativos resolvem embarcar nela. Na época, os preços dispararam impulsionados por narrativas de escassez, gargalos logísticos e outras justificativas convenientes. O desfecho? A maior queda mensal do século. O Brasil exportando 31.3 milhões de toneladas em 12 meses, usinas encurraladas em acumuladores, tradings vendendo puts para comprar calls, apostando cegamente em preços acima de 32 centavos – e o desastre financeiro que veio na esteira dessas apostas. Em resumo: o mercado já nos mostrou que, quando o otimismo cego se instala, a realidade cobra a conta – e ela costuma vir com juros.

Hoje os fundos especuladores estão vendidos 102,875 lotes, segundo o COT (Commitment Of Trades), relatório dos comitentes, publicado pelo CFTC (Commodity Futures Trading Commission), agência independente do governo dos Estados Unidos, que regula os mercados de futuros e opções das commodities, com base na posição de terça-feira passada. Em duas semanas (de 4 a 18 de fevereiro) mercado variou positivamente 93 pontos enquanto a posição dos fundos reduziu 24,215 lotes. Numa regra de três simples, para cada 10,000 lotes de recompra os fundos movem o mercado 38 pontos. Em tese, para zerar a posição eles fariam o mercado subir 400 pontos acima do nível de terça passada.

As usinas já fixaram 72,5% da exportação para a safra 2025/26, conforme nosso modelo em 31 de janeiro. Em janeiro, fixaram mais 3.5 milhões de toneladas a um preço médio de 17.66 centavos de dólar por libra-peso (R$ 2,482/ton). O total fixado soma 21.75 milhões de toneladas, com preço médio de 18.80 centavos de dólar por libra-peso (R$ 2,495/ton). O percentual é inferior ao da safra 2021/22 e 2023/24 (75% fixados no mesmo período), mas supera os 59.2% da safra passada. Para 2026/27, a estimativa de fixação é entre 11% e 12%, um número abaixo do esperado.

A análise técnica do nosso colaborador Marcelo Moreira: Desde o dia 21 de janeiro de 2025, o maio-25 subiu +19.87% (mínima a 16.61 centavos de dólar por libra-peso e fechamento dia 21/fev a 19.91 centavos de dólar por libra-peso). Na última semana, todas as resistências viraram "suportes". Próximas resistências: 20.00/20.50/21.00/21.50/22.00 centavos de dólar por libra-peso. Suportes: 19.69/19.32/19.18/18.98 centavos de dólar por libra-peso. Atenção ao possível cruzamento da média móvel dos 9 dias (18.98 centavos de dólar por libra-peso) com as médias móveis dos 200 e 100 dias (19.18 e 19.32 centavos de dólar por libra-peso). Caso venha a ocorrer, a tendência de alta continuará firme, podendo chegar aos 22.00 centavos de dólar por libra-peso! Provavelmente alguns fundos estão liquidando posições no café (subiu +38% nos últimos 2 meses) e comprando açúcar! O spread V25/H26 voltou a estreitar, encerrando a semana a -23 pontos. Seguimos positivos, com objetivo acima dos 80 pontos no médio prazo.

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Um bom final de semana a todos!

Arnaldo Luiz Corrêa

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