O mercado futuro de açúcar em NY continuou esta semana a queda iniciada na sexta-feira da semana anterior fazendo com que os preços retornassem ao ponto mínimo de 22.80 centavos de dólar por libra-peso negociado no início de julho. No fechamento de sexta-feira, o contrato com vencimento para março/24 encerrou a 23.40 centavos de dólar por libra-peso, com queda acumulada na semana de 169 pontos, pouco mais de 37 dólares por tonelada. Os vencimentos seguintes apresentaram quedas igualmente expressivas de 176 pontos (39 dólares por tonelada) para maio/24 e o mesmo nível de derretimento para julho/24, outubro/24 e março/25. A safra 25/26 encolheu na média 140 pontos (pouco mais de 31 dólares por tonelada). Os fundamentos se vingaram “docemente” dos fundos.
E por falar nos fundos, segundo o CFTC (Commodity Futures Trading Commission), a agência americana reguladora do mercado de commodities, com base no COT (Commitment of Traders), o relatório dos comitentes publicado hoje com base na posição de terça-feira passada, os fundos liquidaram 63.400 lotes, mas devem ainda estar comprados em 80,000 lotes nesta sexta-feira. Apenas para registro, a queda acumulada de 281 pontos (cerca de 62 dólares por tonelada) nos dias 5 e 6 de dezembro foi a quinta maior de 2000 até hoje. Já a queda 196 pontos num só dia (43 dólares por tonelada) foi a décima maior no mesmo período.
A fixação dos preços em reais por tonelada sofreu um forte revés. Preços médios caíram 167 reais por tonelada para a média da safra 24/25 e 129 reais por tonelada para a safra 25/26. Gestão de risco é assunto muito sério.
O mercado quer imputar a queda acentuada dos preços à recente decisão do governo indiano de limitar a produção de etanol a partir de cana-de-açúcar. Esta medida indica um potencial aumento na produção de açúcar na Índia, devido à menor quantidade de cana destinada à fabricação de etanol, e sugere uma redução na necessidade de importação de açúcar pelo país, contrariando previsões anteriores. No entanto, o estrago parece desproporcional. São os fundamentos que se sobrepuseram às narrativas. É óbvio que com o declínio global dos preços do petróleo, torna-se economicamente mais viável para a Índia priorizar a produção de açúcar em vez do etanol, refletindo uma avaliação pragmática da situação atual do mercado. Mas, daí a provocar essa avalanche vai uma abissal diferença.
Será que essa alteração na política abre a possibilidade de o país retomar suas atividades de exportação de açúcar na safra 2024/2025? As anteriores preocupações sobre a escassez de oferta e o déficit global parecem ter se dissipado, quase como um castelo de areia desmoronando sob a pressão de novas informações. Questiona-se agora a realidade de um mercado apertado e deficitário. Com isso, não podemos descartar o potencial de novas quedas nos preços, uma vez que a expectativa de um mercado mais abastecido se instala. A situação exige uma reavaliação cuidadosa das projeções e estratégias por parte dos players do mercado, considerando este novo contexto em que a Índia pode emergir novamente como um ator-chave no cenário de exportações de açúcar.
A queda do mercado já era há muito esperada (por nós, pelo menos). Avistávamos a correção de um mercado que subia com a ajuda dos fundos especuladores calcado em notícias requentadas acerca dos fundamentos altistas do mercado. Mas, um elemento importante foi responsável pela aceleração da queda de NY. Havia mais de 115,000 lotes de puts (opções de venda) vendidas no março/24 entre os preços de exercício de 20 a 27 centavos de dólar por libra-peso.
Conforme o mercado ia caindo, o delta (probabilidade de exercício) da puts subia e aumentava o risco de quem vendera as opções a descoberto com o intuito de capturar prêmio, acreditando que o mercado jamais chegaria naqueles níveis. Quando isso ocorre, o vendedor das puts a descoberto tem duas alternativas: ou vende futuros para que essa venda estanque o prejuízo das puts, ou recompra as opções.
Observando os dados publicados pela ICE, vemos que o número de opções em aberto aumentou no período em que o mercado de açúcar teve uma queda significativa de 200 pontos. Isso indica que a estratégia usada para se proteger das perdas (conhecida como ‘delta hedging’) foi feita principalmente por meio da venda de contratos futuros, o que intensificou a queda dos preços devido ao desespero dos que estavam vendidos nessa posição.
Outro elemento importante na queda acentuada do mercado de açúcar em Nova York é o comportamento das tradings. Essas empresas, acreditando em suas próprias previsões otimistas sobre o mercado, provavelmente tinham posição comprada no mercado futuro de açúcar e nas calls (opções de compra). Quando os preços começaram a cair rapidamente, essas empresas se viram forçadas a liquidar seus contratos futuros de açúcar bem como as calls compradas para limitar suas perdas, um procedimento conhecido como “vendas stop”.
Essas vendas stop são como um mecanismo de emergência que se ativa automaticamente para vender um ativo quando seu preço cai para um determinado nível, ajudando a evitar perdas maiores. Neste caso, essas vendas adicionais contribuíram ainda mais para a queda dos preços do açúcar, resultando em uma situação bastante negativa para o mercado.
Importante mencionar o impacto devastador das operações com acumuladores e opções com barreiras que sofreram severamente com a queda brusca. Usinas tiveram suas estratégias de hedge completamente destruídas por essas estruturas financeiras arriscadas e, em muitos casos, danosas. Apesar de termos alertado repetidamente sobre os perigos dessas abordagens, parece que muitas empresas insistem em ignorar esses riscos. Essa teimosia em adotar táticas financeiras arriscadas continua a resultar em graves consequências, como vimos com a desvalorização acentuada dos hedges de várias usinas, evidenciando uma falta de aprendizado e adaptação às realidades do mercado.
A busca por uma pequena melhoria nas fixações de preço, de um punhado de pontos, leva várias empresas a se aventurarem em estratégias financeiras ilusórias e perigosas, como os acumuladores. No mercado financeiro, esses instrumentos são ironicamente apelidados de “I kill you later” (vou te matar mais tarde), um trocadilho com a palavra “accumulator” (acumulador), devido aos riscos ocultos que eles representam. É fundamental entender que não existem ganhos sem riscos: não há “almoço grátis” no mercado financeiro.
A ideia de que “um mais um só pode ser maior que dois, se um menos um for menor que zero” é uma metáfora financeira. Significa que, para se obter uma vantagem significativa (um ganho acima do esperado), é preciso aceitar uma desvantagem proporcional (um risco de perda maior). Muitas vezes, essa realidade é ignorada, mas as empresas precisam compreender que as vantagens aparentes de certas estratégias trazem consigo riscos igualmente grandes, que podem resultar em perdas devastadoras.
Durante os 20 anos em que a Archer Consulting tem prestado consultoria para empresas do agronegócio, tenho enfatizado constantemente a importância de uma política de risco ou hedge robusta e sensata. Essa política deve proibir, ou pelo menos limitar severamente, o uso de estruturas financeiras arriscadas como acumuladores e opções com barreira, especialmente quando o objetivo é proteger contra riscos de mercado. Tais estratégias podem ser eficazes em mercados de baixa volatilidade, mas são extremamente perigosas em mercados com grandes oscilações de preço.
É essencial que os gestores de risco compreendam essa realidade e parem de acreditar em soluções milagrosas. A verdade inconveniente é que muitos tendem a esquecer essa lição até que uma nova crise surja. É um ciclo de aprendizado e esquecimento que precisa ser quebrado para garantir uma gestão de riscos mais eficaz e responsável no setor sucroalcooleiro.
Bom final de semana
Arnaldo Luiz Corrêa
This week, the sugar futures market in New York continued the drop started on Friday the previous week making prices return to the lowest point of 22.80 cents per pound traded in early July. At Friday’s closing, the contract for March/2024 closed out at 23.40 cents per pound, with an accumulated drop in the week of 169 points, a little more than 37 dollars per ton. The following trading contracts showed equally expressive drops of 176 points (39 dollars per ton) for May/2024, October/2024 and March/2025. The 2025/2026 crop shrank 140 points on average (a little more than 31 dollars per ton). The fundamentals took a “sweet” revenge on the funds.
And speaking of the funds, according to the CFTC on the COT released Friday based on Tuesday’s position, the funds liquidated 63,400 lots, but should still be long by 80,000 lots this Friday. Just for the record, the accumulated drop of 281 points (about 62 dollars per ton) on December 5 and 6 has been the fifth largest since 2000. Now, the 196-point drop on a single day (43 dollars per ton) has been the tenth largest over the same period.
Prices in real per ton suffered a serious setback. The average prices fell 167 real per ton for the 2024/2025 crop and 129 real per ton for the 2025/2026 crop. Risk management is a very serious subject.
The market wants to blame the sharp price fall on the recent decision of the Indian government to limit sugarcane ethanol production. This measure shows a potential increase in sugar production in India due to the smaller amount of sugarcane for ethanol production and suggests a reduction in the need for sugar import by the country, contradicting previous forecasts. However, the damage seems to be disproportional. It’s the fundamentals that have overlapped the narratives. Of course, with the global oil price fall, it becomes economically more feasible for India to prioritize sugar production instead of ethanol production, reflecting a pragmatic assessment of the current situation of the market. But causing this avalanche is going too far.
Could this change in policy open up the possibility for the country to resume its sugar export activities in the 2024/2025 crop? The previous concerns over the shortage of supply and global deficit seem to have dissipated, almost like a sandcastle crumbling under the pressure of new information. Now there are questions about the reality of a tight and scarce market. So, we cannot rule out the potential for new price drops, once the expectation for a more supplied market is taking root. The situation demands a careful reassessment of the projections and strategies on the part of the market players, taking into account this new context where India can emerge in the sugar export scenario as a leading actor again.
The market fall has been expected for a long time (at least by us). We saw the correction of a market that was going up with the help of the hedge funds based on old news about the bullish fundamentals of the market. But an important element was responsible for the speed-up of the fall in New York. There were more than 115,000 lots of puts sold on the March/2024 between exercise prices of 20 and 27 cents per pound.
As the market was falling, the delta (probability of exercise) of the puts was growing and increasing the risk for those who had short position in order to capture premium, believing that the market would never reach those levels. When that happens, the seller of uncovered puts has two alternatives: he either sells futures so that this sale halts the loss of the puts or he rebuys the options.
Going over the data published by the ICE, we see that the number of short options increased over the period where the sugar market had a significant fall of 200 points. That means that the strategy used to protect from losses (known as “delta hedging”) was carried out mostly through the sale of futures contracts, which intensified the price fall due to the despair of those who were short at that position.
Another important element for the sharp fall of the sugar market in New York is the behavior of the trading companies. These companies, believing in their own optimistic forecasts about the market, probably had a long position on the sugar futures markets and on the calls as well. When the prices started falling fast, these companies were forced to liquidate their sugar futures contracts as well as the long calls to limit their losses, a procedure known as “stop sales”.
These stop sales are like an emergency mechanism that automatically triggers itself to sell an asset when its price falls to a certain level, helping to avoid greater losses. In this case, these additional sales contributed even more to the sugar price fall, resulting in a pretty negative situation for the market.
It’s important to mention the devastating impact of the operation with accumulators and options with barriers that were strongly affected by the sharp fall. Mills had their hedge strategies totally destroyed by these risky, and in many cases, damaging financial structures. Although we had over and over again warned about the dangers of these approaches, it seems like many companies insisted on ignoring these risks. This stubbornness to adopt risky financial tactics continues to result in serious consequences, as we saw with the sharp devaluation of the hedges of several mills, highlighting a lack of learning of and adaptation to market realities.
The search for a small improvement on pricing – a handful of points – leads several companies to venture into illusory and dangerous financial strategies, such as the accumulators. On the financial market, these tools are ironically dubbed as “I kill you later”, a pun on the word “accumulator” due to the hidden risks they represent. It’s vital to understand that there are no gains without risks: there is no “free lunch” on the financial market.
The idea that “one plus one can only be more than two if one minus one is less than zero” is a financial metaphor. It means that in order to have a significant edge (a gain above the expected), it is necessary to accept a proportional disadvantage (a risk for a greater loss). Many times, this reality is ignored, but the companies have to understand that the apparent advantages of certain strategies carry equally great risks with them, which can result in devastating losses.
Over the 20 years Archer Consulting has been providing agribusiness companies with consulting, I have constantly pointed out the importance of a risk or strong and sensible hedge policy. This policy must ban, or at least strongly limit, the use of risky financial structures such as accumulators or options with barriers, especially when the goal is to hedge against market risks. Such strategies can be effective on low-volatility markets, but they are extremely dangerous on markets with great price fluctuations.
It’s essential that risk managers understand this reality and quit believing in miracle solutions. The inconvenient truth is that many tend to forget this lesson until a new crisis comes along. It’s a learning and forgetfulness cycle that needs to be broken to assure a more effective and responsible risk management in the sugar-alcohol sector.
You all have a great week.
Arnaldo Luiz Corrêa