Correndo o risco de me antecipar aos fatos, mas já arriscando um palpite, parece que estamos começando a testemunhar uma reviravolta no mercado de açúcar em NY. Após ser fortemente pressionado por variações cambiais bem acima da média—quem não se lembra do dólar flertando com os R$ 5,9000? e pela constatação do colossal fluxo de exportação de açúcar do Brasil, que despejou quase 38 milhões de toneladas no mercado internacional em apenas doze meses, o cenário ficou complicado. E, como se não bastasse, os fundos especulativos "dando uma mãozinha" na queda, sem ligar muito para os fundamentos, e o ritmo frenético da moagem influenciando as decisões, era de se esperar que o mercado futuro não tivesse outro caminho a seguir além da queda. Afinal, como ignorar um viés baixista tão evidente?
No entanto, a situação dos canaviais está muito mais crítica do que se imaginava. As cenas angustiantes dos incêndios que afetaram diversas usinas, amplamente compartilhadas nas mídias sociais, dão uma ideia de como o problema se espalha, mesmo quando parece ser algo isolado. O consenso de que a moagem no Centro-Sul ficaria em torno de 605 milhões de toneladas já foi por água abaixo. Depois de apontar os lápis e refazer as contas, esse número está rapidamente caminhando para os 600 milhões de toneladas, com viés de baixa. E, sinceramente, não ficaria surpreso se encerrássemos o ano com 590 milhões de toneladas moídas.
O impacto dos incêndios nos canaviais ainda carece de melhor avaliação, mas obviamente que a cana queimada tende a perder qualidade, especialmente em relação ao teor de sacarose, que é fundamental para a produção de açúcar e etanol. A cana queimada precisa ser processada rapidamente para minimizar as perdas de açúcar, mesmo assim, a eficiência do processo (leia-se a cristalização) pode ser comprometida. Há também aumento de resíduos, como cinzas e materiais queimados, que aumentam as impurezas do caldo extraído, exigindo mais tratamento durante a produção.
Estará a safra 25/26 no Centro-Sul também comprometida? O fogo pode danificar as raízes e os toletes (brotações) da cana, o que pode prejudicar o replantio e o crescimento das próximas safras, reduzindo a produtividade futura do canavial. Esse, para mim, é um ponto que necessita cuidadosa observação. Vou repetir o que disse aqui no último comentário: “Se a safra 25/26 sofrer do déficit hídrico proveniente desta safra corrente, prepare-se para preços mais altos. Bem mais altos.”
Insensível a tudo isso, e nem poderia ser diferente dada a natureza do seu negócio, os fundos especulativos dão de ombros e – segundo o COT (Commitment Of Trades), relatório dos comitentes, publicado nesta sexta-feira pelo CFTC (Commodity Futures Trading Commission), agência independente do governo dos Estados Unidos, que regula os mercados de futuros e opções das commodities, com base na posição de terça-feira passada, estavam vendidos 70,960 lotes.
Eles talvez nem percebam, mas a posição dos fundos especulativos está mais vulnerável do que parece. A combinação da preocupante situação hídrica nos campos com a crescente probabilidade de uma "morte súbita" pode ser o estopim para uma explosão nos preços. E como se não bastasse, ainda vamos enfrentar uma longa entressafra. Como sabemos, uma entressafra prolongada exige ajustes no planejamento agrícola, como a antecipação ou o adiamento do plantio da próxima safra. E isso pode impactar a produtividade futura, dependendo das condições climáticas e da saúde do solo. Ou seja, é um verdadeiro efeito dominó.
Agora, vamos imaginar um cenário hipotético: supondo que a Índia não retorne ao mercado internacional até pelo menos abril do ano que vem, que a tal "morte súbita" ocorra em outubro, e que a safra 25/26 seja comprometida pelos fatores já mencionados... como ficariam os preços no início do ano? Bem, NY terá que negociar a um valor que faça a Índia repensar sua política de exportação, oferecendo preços melhores do que os praticados no mercado interno de lá. É como tentar convencer alguém a sair de casa oferecendo algo melhor do que o sofá e a TV—não vai ser fácil, mas é possível!.
Se tivermos uma combinação de fatores – hoje aparentemente com pouca probabilidade – como o preço do petróleo acima de 80 dólares por barril e os grãos recuperando a queda (soja acumula perda de 23% no ano e o milho, 25%), quem sabe aqueles 30 centavos de dólar por libra-peso tão sonhados pelo mercado no último trimestre do ano passado não se torne realidade. Calma, é apenas uma conjectura.
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Bom final de semana
Arnaldo Luiz Corrêa